A conciliação como alternativa ao superendividamento do consumidor

por De Paula & Nadruz

26/11/2021

A oferta massiva de crédito tem induzido a um comportamento que leva o consumidor a comprar de forma insaciável. Atraído pela publicidade agressiva e tendo alcance a crédito fácil, o consumidor acaba contraindo dívidas, sem possuir condições financeiras para arcar com os custos.  

O atual endividamento dos brasileiros se deve principalmente à fácil oferta de crédito, sobretudo dívidas contraídas junto a cartão de créditos e empréstimos consignados. Em abril/2021, 80,9% das famílias com dívidas recorreram ao crédito do cartão, recorde histórico, informou a CNC - Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo1.

O superendividamento é definido como "a impossibilidade global de o devedor pessoa física, consumidor, leigo e de boa-fé, pagar todas suas dívidas atuais e futuras de consumo" (MARQUES, 2006, p. 256).

No entanto, entrou em vigor, no início de julho de 2021, a Lei 14.181/21, que alterou o Código de Defesa do Consumidor e estabeleceu uma série de medidas para evitar o superendividamento. A referida Lei definiu que o superendividamento consiste na "impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação" (artigo 54-A, do CDC).

A inadimplência do consumidor ocorre quando ele atrasa o pagamento de suas dívidas, sobretudo em relação a contas fixas, tais como água, energia elétrica, aluguel, condomínio, telefone e plano de saúde. Trata-se de um sinal de que este consumidor está começando a se endividar ou já é um superendividado.

Ressalta-se que este processo de superendividamento foi potencializado pela pandemia COVID-19. O orçamento das famílias brasileiras foi impactado pela diminuição da oferta de trabalho, redução de horas extras, redução das margens de lucros em razão dos sucessivos lockdown's do comércio, demissões, etc. Este contexto fático forçou as pessoas a recorrer ao crédito bancário para pagar dívidas e despesas contraídas, além de manter um nível mínimo de consumo.

A Lei 14.181/21 estabeleceu as premissas da boa-fé do consumidor, renegociação amigável, reeducação do consumidor e reinserção do consumidor endividado na economia. Dentre as mudanças mais significativas, a Lei passou a prever a possibilidade de o consumidor superendividado requerer a instauração de processo de repactuação das dívidas, com a presença de todos os credores em audiência conciliatória, para aprovação de proposta de plano de pagamento. Ressalta-se que o não comparecimento de qualquer credor traz como consequência a interrupção dos encargos de mora, a sujeição compulsória deste credor ao plano de pagamento da dívida, além da postergação do pagamento da dívida deste credor para momento posterior ao pagamento dos demais credores (artigo 104-A, do CDC).

A nova Lei também incluiu no Código de Defesa do Consumidor a necessidade de instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos do superendividamento, como instrumentos de recuperação da vida financeira do consumidor (artigo 5º, inciso VII, do CDC).

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, antes mesmo da vigência desta Lei, iniciou projeto em 2010 e criou o CEJUSC Endividados, isto é, um Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania especializado no tratamento de situações de superendividamento do consumidor.

Através deste projeto inovador, o consumidor maior de 18 (dezoito) anos, de boa-fé, que contraiu dívida por má administração do seu orçamento, sem capacidade econômica de efetuar seu pagamento, e que não a tenha contraído para atividade profissional, pode acessar as plataformas online do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e preencher formulário para atendimento e indicar credores com os quais pretende negociar. Após a realização da audiência, lavra-se uma ata de acordo, a ser homologada pelo Juiz de Direito, e que obriga a todos os signatários, nos seus exatos termos.

Ressalte-se que não podem serem repactuadas, com base na referida Lei, as dívidas de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural, bem como as indenizações, dívidas fiscais, alimentícias e em favor de empresas públicas da União.

A nova Lei também passou a garantir ao consumidor a educação financeira, prevenção de situações de superendividamento, com a preservação do mínimo existencial. Além de proibir propagandas de empréstimos do tipo "sem consulta ao SPC/SERASA" ou sem avaliação da situação financeira do consumidor.

Por fim, a Lei 14.181/21 permitiu ao consumidor que informe à administradora do cartão de crédito, com dez dias de antecedência do vencimento da fatura, sobre parcela que está em disputa com o fornecedor. O valor não poderá ser cobrado enquanto não houver uma solução para a disputa.

  • É importante frisar que a proteção do consumidor superendividado não pode ser considerada como proteção pura e simples do inadimplente. Trata-se de tentativa de fazer com que os fornecedores de crédito informem ao consumidor de forma adequada e assumam a sua responsabilidade social de contratar com consumidor que tenha condições de cumprir o contrato, garantindo-lhe o real direito à liberdade de escolha e preservando a sua dignidade.

Em um momento extremamente difícil e delicado para a economia mundial, em razão da pandemia COVID-19, a vulnerabilidade do consumidor fica ainda mais evidente, sobretudo pela redução da renda já tratada antes, fruto da diminuição da oferta de trabalho, redução de horas extras, redução das margens de lucros em razão dos sucessivos lockdown's do comércio, demissões, etc

Neste contexto, a tentação em aceitar ofertas de crédito massivas é grande. Muitas vezas, a contratação de crédito não é feita de forma absolutamente responsável, através da análise ponderada da capacidade do consumidor.

Reforça-se que para remediar isto é que foi promulgada a Lei 14.181/21, oferecendo, para o tratamento do superendividamento, o processo de repactuação de dívidas, no qual é realizada audiência conciliatória, com a presença de todos os credores, em que o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 05 (cinco) anos. A conciliação é um procedimento rápido, econômico e seguro. O acordo é satisfatório para as duas partes, o consumidor consegue pagar os débitos com os credores e organiza a sua situação financeira. Já credores recebem os valores acordados e evitam a judicialização da cobrança.

Priorizando a contratação de crédito responsável, partindo-se das premissas da boa-fé do consumidor, renegociação amigável, reeducação do consumidor e reinserção do consumidor endividado na economia, a nova Lei viabiliza a recuperação econômica do consumidor, através de mecanismos consensuais que podem beneficiar todos os envolvidos, se bem planejados.

Portanto, a vigência da Lei 14.181/21, durante o período da crise sanitária, permite a oportunidade de reconstrução da economia brasileira, através de medidas adequadas e suficientes para prevenir os efeitos colaterais da pandemia COVID-19, sobretudo em relação ao superendividamento dos consumidores. A Lei é positiva e constituirá um forte instrumento de afirmação da cidadania do consumidor.

Fonte: Migalhas

Tags: Dicas, Direitos, Informativos, Mercado

Categoria: Informativos

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